Livro homenageia advogado transmontano que foi perseguido, preso e lutou contra a ditadura em Portugal


Obra “Enterrem-me na Vertical”, de Clara Macedo Cabral retrata a vida do seu avô, José Alberto Rodrigues, mais conhecido por Dr. Cabaninhas, um ativista político na oposição democrática ao regime do Estado Novo.

No sábado, 23 de novembro, a Biblioteca Municipal de Vila Pouca de Aguiar voltou a receber Clara Macedo Cabral, que a 25 de abril no âmbito das comemorações dos 50 anos da Revolução dos Cravos inaugurou a exposição “Enterrem-me na vertical - Dr. Cabaninhas: uma vida a lutar pela liberdade.” Na altura prometeu regressar em breve para apresentar o seu livro com o mesmo nome “Enterrem-me na Vertical”, livro que retrata a vida do seu avô, José Alberto Rodrigues, mais conhecido por Dr. Cabaninhas, um ativista político na oposição democrática ao regime do Estado Novo.

Clara Macedo Cabral, vive em Londres há quase 20 anos, tem encontrado nessa encruzilhada de culturas a fonte para a sua escrita. Depois do primeiro livro “Há Raposas no Parque” (QuidNovi,2009) nomeado para o Prémio Talento, publicou “O Inverno das Raposas” (Orfeu, 2011) e “Lisbon Story” (Principia, 2013). Seguiram-se o “Último Rei de Portugal e a Magos: uma Aliança Anglo-Lusa” (Fundação da Casa de Bragança, 2015) e “A Inglesa e o Marialva: um amor na arena” (Casa das Letras, Leya, 2018), romance baseado na vida real de uma inglesa no Portugal dos anos 60 e que integra o Plano Nacional de Leitura. Em “Diário da Bela Vista” (Junta de Freguesia da Estrela, 2020) relatou-nos a experiência familiar dos dias da pandemia repartidos entre Lisboa e Londres. Hoje apresenta “Enterra-me na Vertical” uma bibliografia em homenagem ao seu avô, José Alberto Rodrigues.

Com a casa bem composta o vice-presidente da Câmara Municipal de Vila Pouca de Aguiar, Filipe Nascimento, enalteceu a apresentação deste livro no ano da comemoração dos 50 anos do 25 de abril. “Um ilustre transmontano que nasceu em Valpaços, mas que passou uma parte da sua vida em Vila Pouca de Aguiar, e para nós é sempre um orgulho ter personalidades que se destacaram a nível nacional, ainda mais em prol de algo tão importante como a luta pela democracia em Portugal”.

A apresentação do livro ficou a cargo do engenheiro Delfim Santos, que conheceu o José Alberto Rodrigues quando tinha 18 anos. Teve o privilégio de conviver com ele, cerca de 10 anos, até à sua morte. Segundo a autora, Delfim Santos foi um pilar importante para conseguir fazer a ligação do seu avô a Vila Pouca de Aguiar. Clara Cabral destacou a escolha do título “Enterrem-me na Vertical” onde num comício em 1969 em Valpaços, numa sessão de esclarecimento da oposição democrática, disse o seguinte: “quando morrer quero ser enterrado de pé como de pé tenho vivido”. Acabou por não ser enterrado na vertical como ele queria, mas está sepultado no cemitério de São Martinho de Bornes em campa rasa.

Daniel Alves, presidente da Junta de Freguesia de Vila Pouca de Aguiar, destacou a importância deste livro apresentado num ano simbólico para o país. Destacou ainda a personalidade forte, vincada, aguerrida e lutadora do Dr. Cabaninhas. “Era um encanto ouvi-lo falar porque falava bem, falava acertado era assertivo e chegava a todas as classes sociais e a todas as pessoas com um diálogo incontornável. Hoje em dia podemos agradecer em viver em democracia, graças a pessoas como o Dr. Cabaninhas que sempre lutou pelos valores democráticos”.

Por último Clara Macedo Cabral, autora do livro, agradeceu a todos que se empenharam neste livro. “Um agradecimento especial ao engenheiro Delfim Santos e ao professor Albertino Sousa que foram incansáveis, um por ter convivido de perto com o meu avô e o outro, pelo seu conhecimento histórico. Quando cheguei aqui a Trás-os-Montes, há três anos atrás sabia zero e aos poucos fui conhecendo família que desconhecia”. A neta do homenageado agradeceu ainda à Câmara Municipal de Vila Pouca de Aguiar, “ao professor Alberto Machado e a este executivo que sempre apoiaram este livro, ao Paulo Cristiano e a todos os bibliotecários do Alto Tâmega que estão a receber este livro, à Dra. Marilita, à engenheira Arlete, ao Henrique Campos, ao Zeca Vicente, ao Joel Magalhães que foi incansável na elaboração da exposição apresentada no 25 de abril e a todos que ajudaram a fundamentar este livro que retrata a vida do meu avo José Alberto Rodrigues”.

Resumo livro:

“Enterrem-me na Vertical” conta-nos a história, ainda pouco explorada e desenvolvida, do lado familiar de quem se envolveu na luta contra o antigo regime. A autora, neta do biografado, parte em busca desse passado doloroso e silenciado. A narrativa é intersectada pelas vozes das tias que partilham com ela recordações, ao mesmo tempo que refletem nas consequências das opções políticas do pai, longos anos perseguido e preso político. O livro dá-nos a conhecer a figura de José Alberto Rodrigues, advogado de renome no Norte de Portugal.

Nascido em 1905, na Terra Fria Transmontana, a sua visão do mundo será moldada pelas práticas comunitárias da sua aldeia, Cabanas; refúgio seguro das perseguições da polícia política e responsável pelo nome por que ficará conhecido: Dr. Cabaninhas.

Ao longo da escolaridade, absorve o ideário republicano. E na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa participa no golpe do Reviralho de Fevereiro de 1927 ao Rato. No início da sua carreira enquanto conservador do registo civil de Terras de Bouro conhece Emília, chefe de estação dos CTT, mãe das suas três filhas, com quem viverá o seu mais duradouro amor.

Em novembro de 1933 é preso, deportado, torturado e julgado no Forte de São João Baptista em Angra do Heroísmo, na sequência de outro golpe reviralhista.

Libertado com sequelas físicas, vê-se expulso da função pública. Conserva-se nos anos seguintes e durante a Guerra Civil espanhola no exílio em Espanha e na raia, onde beneficia da solidariedade da população galaico-portuguesa.

Participa no Movimento do MUD onde fez parte da Comissão Central, da campanha de candidatura do General Norton de Matos às presidenciais, e da Comissão Central do MND. Em 1958 tem papel de peso na campanha do general Humberto Delgado, acompanhando-o em toda a jornada pelo Norte.

É duas vezes candidato a deputado pelas listas da oposição. Morre em 1979, depois de testemunhar com alegria o 25 de Abril.

Seria muito lembrado pela sua ação em favor dos humildes, a quem defendia frequentemente de borla, com firmeza e coragem, servido de excelentes qualidades de orador e inteligência. 


Fotos: Joel Magalhães


25/11/2024

Cultura


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