Comissão Europeia escolhe projeto de lítio do Barroso e da mina do Romano como estratégicos


Em Portugal foram escolhidos pela Comissão Europeia quatro projetos estratégicos, entre eles o projeto da mina de lítio do Barroso, em Boticas e o projeto de lítio da mina do Romano em Montalegre. As associações contestam este “selo” de credibilidade, já as empresas promotoras dos projetos aplaudem a escolha.

A Comissão Europeia escolheu esta terça-feira, 25 de março, quatro projetos em Portugal, três de lítio e um de cobre, como estratégicos por serem referentes a matérias-primas críticas, de um total de 47 aprovados na União Europeia (UE), com este “selo” de credibilidade, em 124 candidaturas.

Este órgão executivo da União Europeia adotou, pela primeira vez, uma lista de 47 projetos estratégicos “para aumentar as capacidades nacionais de matérias-primas estratégicas, o que, por sua vez, reforçará a cadeia de valor das matérias-primas europeias e diversificará as fontes de abastecimento”, referiu a Comissão Europeia.

De acordo com Bruxelas, os novos projetos estratégicos estão alinhados com a nova Lei das Matérias-Primas Críticas, que visa “garantir que a extração, transformação e reciclagem de matérias-primas estratégicas na Europa satisfaçam respetivamente 10%, 40% e 25% da procura da UE até 2030”.

Em Portugal, foram selecionados como estratégicos os projetos de lítio da Mina do Barroso em Boticas, da Savannah e da Mina do Romano em Montalegre, da Lusorecursos, desde há anos, contestado por ambientalistas e residentes, bem como o projeto de extração e processamento de cobre da Mina de Neves-Corvo em Castro Verde. Além dos projetos de extração, a Comissão considera ainda de importância estratégica a refinaria de lítio da Bondalti, do Grupo José de Mello, em Estarreja.

A Comissão Europeia destaca que os projetos selecionados “contribuem significativamente para as transições ecológica e digital da Europa, apoiando simultaneamente a indústria da defesa e a indústria aeroespacial europeias”.

ONG E ASSOCIAÇÕES CONTESTAM ESCOLHA DE MINAS COMO PROJETOS ESTRATÉGICOS  E PEDEM REVISÃO DA DECISÃO

Num comunicado conjunto, Organizações não-governamentais (ONG) e associações comunitárias anunciaram que vão pedir à Comissão Europeia que reveja a decisão de escolher como projetos estratégicos, na Europa, minas a céu aberto de lítio e outros minerais.

Entre a GEOTA (Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente), a PowerShift e a MiningWatch Portugal, ONG`s, está também a associação Unidos em Defesa de Covas do Barroso que em conjunto com as ONG`s apontadas alerta para os impactos destes projetos ‘estratégicos’ de mineração.

“A exploração de matérias-primas baratas para a indústria automóvel na Alemanha e noutros países só traria desvantagens para nós. Vivemos da pecuária sustentável e dependemos da preservação dos rios limpos e das pastagens verdes. Isto não é uma transição justa. Minas em Portugal não cumprem as regras. E as autoridades estão de braços cruzados. As quatro minas a céu aberto e as escombreiras projetadas não seriam aceitáveis nem do ponto de vista ambiental nem social. Por isso, vamos pedir formalmente à Comissão que reveja a sua decisão”, afirma Nelson Gomes, da Unidos em Defesa de Covas do Barroso, que se opõe aos planos da investidora britânica Savannah Resources.

O responsável acrescenta ainda que as minas a céu aberto e as escombreiras projetadas “não seriam aceitáveis nem do ponto de vista ambiental nem social” e, por isso, disse que as organizações vão pedir “formalmente à comissão que reveja a sua decisão”.

A contestação das organizações estende-se de Portugal (minas do Barroso em Boticas e do Romano em Montalegre), à Sérvia, Roménia (projeto de ouro-cobre Rovina), Alemanha (Zinnwald) e Espanha (mina de lítio de San José).

De acordo com as organizações, na reunião do Conselho das Matérias-Primas europeu, que decorreu em fevereiro, o Ministério do Ambiente e da Energia português “deu luz verde à Comissão para os projetos anunciados, não exercendo o seu direito de veto”.

Michael Reckordt, especialista em matérias-primas da PowerShift e cofundador da rede europeia EU Raw Materials Coalition, também citado no comunicado, disse que “os projetos estratégicos visam garantir o abastecimento da indústria europeia sem iniciar um repensar ecológico e social.Em vez de reduzir o consumo através de medidas como veículos mais pequenos ou a proibição de cigarros eletrónicos descartáveis e produtos afins, o objetivo é simplesmente extrair mais matérias-primas. A proteção do ambiente, a participação democrática e a transparência desempenham aqui um papel secundário”.

SAVANNAH DIZ QUE CLASSIFICAÇÃO COMO PROJETO ESTRATÉGICO É RECONHECIMENTO PELA “QUALIDADE DO TRABALHO”

A empresa Savannah disse que a classificação da mina de lítio do Barroso como projeto estratégico pela Comissão Europeia é um reconhecimento pela “qualidade do trabalho” que está a desenvolver no concelho de Boticas.

A mina do Barroso e do Romano foram viabilizadas pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA), com a emissão de uma Declaração de Impacto Ambiental (DIA) favorável condicionada em 2023.

“A conclusão do processo de classificação como projeto estratégico representa um passo para a Europa e para todos os setores de futuro que dependem dos minerais críticos. No que diz respeito ao projeto de lítio do Barroso, esta classificação reconhece a qualidade do trabalho que a Savannah tem vindo a desenvolver há vários anos, não só nos aspetos técnicos, mas também nos parâmetros sociais e económicos do projeto, incluindo o nosso envolvimento e colaboração com as comunidades locais”, afirmou, citado em comunicado, o presidente executivo (CEO) da Savannah Resources.

Segundo Emanuel Proença, atualmente, a equipa da Savannah local conta com cerca de 30 pessoas, a que se somam várias dezenas de empregos indiretos, que vivem e trabalham diariamente na região do Barroso, acrescentando que a estas “muitas mais se juntarão”.

“A Savannah está comprometida com o desenvolvimento sustentável do projeto, respondendo às necessidades da comunidade e criando condições para um desenvolvimento económico sólido da região do Barroso”, salientou ainda.

A empresa acrescentou que irá agora trabalhar com a Comissão Europeia para “aproveitar plenamente as oportunidades que esta nova classificação proporciona”.

Este trabalho, apontou, decorrerá em paralelo com a conclusão da submissão do Relatório de Conformidade Ambiental do Projeto de Execução (RECAPE) e do Estudo de Viabilidade Definitivo, prevista para o final de 2025, com o objetivo de iniciar a produção em 2027.

LUSORECURSOS CONSIDERA"UM MARCO" A DISTINÇÃO DE MINA DO ROMANO COMO PROJETO ESTRATÉGICO

A Lusorecursos disse que a classificação da mina do Romano, em Montalegre, como projeto estratégico pela Comissão Europeia “é um marco” porque reconhece o “papel central” que Portugal pode desempenhar na transição energética europeia.

“Este reconhecimento representa um marco estratégico não só para a Lusorecursos, mas para Portugal, ao reconhecer o papel central que o nosso país pode desempenhar na transição energética da Europa”, afirmou fonte da empresa à agência Lusa.

“Ao sermos incluídos pela Comissão Europeia na lista restrita de projetos estratégicos de matérias-primas da Europa reafirmamos o nosso forte comprometimento em trabalhar em estreita colaboração com as autoridades nacionais, regionais e locais, garantindo que todas as etapas do projeto decorrem com transparência, responsabilidade ambiental e diálogo contínuo com as comunidades”, acrescentou a empresa à Lusa.

Estes 47 novos projetos estratégicos estão localizados em 13 Estados-membros da UE que, além de Portugal, incluem a Bélgica, França, Itália, Alemanha, Espanha, Estónia, República Checa, Grécia, Suécia, Finlândia, Polónia e a Roménia.

Para se tornarem operacionais, os 47 projetos estratégicos têm um investimento de capital global previsto de 22,5 mil milhões de euros.

Entre os beneficiários desta distinção está o apoio coordenado da Comissão, dos Estados-membros e das instituições financeiras para se tornarem operacionais, nomeadamente no que diz respeito ao acesso ao financiamento e ao apoio para estabelecer ligações com os compradores relevantes.

De acordo com o executivo europeu, estes projetos beneficiarão igualmente de disposições simplificadas em matéria de licenciamento, a fim de assegurar a previsibilidade para os promotores de projetos, salvaguardando simultaneamente as normas ambientais, sociais e de governação.

A Lei das Matérias-Primas Críticas entrou em vigor em 23 de maio de 2024 e prevê que o processo de concessão de licenças não exceda os 27 meses para os projetos de extração e 15 meses para os outros.

Atualmente, os processos de licenciamento na UE podem durar entre cinco e 10 anos.

 

Sara Esteves

Foto: DR

 


25/03/2025

Sociedade


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