Comunistas contestam a Avaliação de Impacte Ambiental da Mina do Barroso


Depois de conhecida publicamente a decisão favorável da Agência Portuguesa do Ambiente à Avaliação de Impacto Ambiental (AIA) com vista à ampliação da Mina do Barroso. Dado o período temporal relativamente largo que nos separa do início do processo e a sua complexidade, a Direção da Organização Regional de Vila Real (DORVIR) do Partido Comunista Português (PCP) considera necessário fazer uma breve súmula dos acontecimentos.

Através de uma nota enviada aos Órgãos de Comunicação Social a DORVIR do PCP fez saber que a concessão mineira denominada "Mina do Barroso" localiza-se na proximidade das localidades de Covas do Barroso, Dornelas e Vilar e Viveiro, no concelho de Boticas. “O contrato de exploração assinado em 2006 previa uma exploração de depósitos minerais de feldspato e quartzo numa área de 70ha (dos quais apenas 15ha seriam explorados) num período inicial de 30 anos, sendo a empresa promotora a “Saibrais – Areias e Caulino, S.A.””.

Segundo os comunistas, nos anos seguintes foi realizada prospeção e pesquisa na área envolvente. “Perante a descoberta de minerais de lítio a empresa concessionária – que à época era a multinacional francesa IMERYS - solicitou a ampliação da concessão. Ampliação essa que foi deferida, aumentando a área para 542ha (dos quais 28ha passaram a ser explorados). A adenda ao contrato estipulou que qualquer actividade de exploração situada no exterior da área licenciada originalmente, estaria sujeita a novo procedimento de AIA. Esse novo procedimento foi iniciado em Julho de 2020, já pela multinacional britânica Savannah. Tratou-se de mais um pedido de aumento da área de concessão e exploração (593ha e 71ha, respectivamente). Acompanhando esse pedido, foi apresentado novo Estudo de Impacto Ambiental (EIA) que acabou por receber um parecer desfavorável, em Junho de 2022. A Comissão de Avaliação (CA) fundamentou tal decisão em impactes negativos significativos, designadamente ao nível dos recursos hídricos, sistemas ecológicos, paisagem e socioeconomia, impactos que enumera ao longo de 9 páginas e que reproduzimos abaixo, em síntese, aproveitando para subscrever e enfatizar a sua relevância: Considerados como sendo de particular importância. Impactos sobre os recursos hídricos superficiais e subterrâneos: O EIA desvaloriza, de uma forma geral, os impactes sobre os recursos hídricos, referindo simplesmente, sem qualquer tipo de sustentabilidade técnica, que a exploração da Mina do Barroso não vai colocar em causa o estado das massas de água; impactos ao nível dos sistemas ecológicos: em particular os impactes sobre valores naturais ameaçados; impactos ao nível da paisagem: a área prevista explorar insere-se integralmente no interior da “Área do Barroso”, classificada como Património Agrícola Mundial pela Unesco; impactos ao nível socioeconómico: alguns deles até irreversíveis e não minimizáveis”, lê-se no documento enviado para a redação.

Considerados como impactos negativos, embora minimizáveis, sobre o património; emissões de partículas; poluição sonora/ruído; falta de adequada caracterização da perigosidade dos resíduos de extração, o estudo acresce ainda que a maioria dos pareceres recolhidos durante a fase de consulta pública, particularmente os do Município de Boticas e das populações locais, vão no mesmo sentido da decisão da Agência Portuguesa do Ambiente. Note-se que nesse período a DORVIR do PCP emitiu nota de imprensa onde destacou a seguinte posição de princípio: “Os interesses nacionais não podem ser comprometidos junto de qualquer empresa. Os recursos minerais podem e devem contribuir para o desenvolvimento do País, sendo desejável ponderar o seu aproveitamento, após avaliar os riscos ambientais e a possibilidade de os minimizar, bem como o impacto noutras atividades económicas. No entanto, o eventual papel benéfico para o País que o aproveitamento de forma sustentável dos nossos recursos minerais permite, não é compatível com lógicas de natureza colonial, que visam a apropriação de matérias-primas por grupos económicos, interessados apenas no lucro e em descartar-se das consequências negativas que a sua atividade causará”.

Naquela altura já era possível encontrar elementos indiciando a incompatibilidade entre os interesses locais/nacionais e a autorização de ampliação da área concessionada. “Nomeadamente o contraste entre a proficuidade das promessas da empresa e a escassez dos mecanismos de fiscalização e inspecção do Estado Português, bem como a desconsideração pela propriedade comunitária no local (pertencente à Comunidade Local dos Baldios de Covas do Barroso). Na sequência do parecer desfavorável, a empresa apresentou, em Março deste ano, novo Estudo de Impacte Ambiental relativo ao projeto modificado de Ampliação da Mina do Barroso”. 

As principais alterações, segundo o PCP, foram quantitativas e não qualitativas: “aumentou o número de documentos apresentado (1.776 ficheiros para consulta pública); aumentou a participação no processo de Consulta Pública (916 participações); aumentou também a contestação pública e o conflito com os baldios. Mantiveram-se, no entanto, as omissões e fragilidades do processo. Perante impactos negativos muito significativos, a empresa afirma existirem soluções viáveis que depois não fundamenta adequadamente”. A título de exemplo referem que em termos de Recursos Hídricos, a empresa “afirma que os reservatórios de água – na versão alterada - permitirão suprir as necessidades de água de todas as atividades da Mina do Barroso (que são muito significativas, na ordem do meio milhão de metros cúbicos / ano). A CA afirma que apesar das modificações, o projeto continua a ter impacto significativo nos recursos hídricos e que tal resultará na inevitável destruição de habitats ripícolas bem conservados, para além de ter reservas quanto às disponibilidades hídricas para manter a vegetação a jusante da exploração e, sobretudo, os lameiros e as sebes vivas, prevendo, por isso, impacto negativo no Sistema Agro-Silvo-Pastoril do Barroso”.

Paisagem, acessos a construir e novos impactos. A empresa apresenta um Estudo Preliminar de um novo acesso a construir que irá ligar Carreira da Lebre ao Nó de Boticas/Carvalhelhos da A24, com vista a minorar impacto nas populações vizinhas. “A CA valoriza a medida, para logo de seguida alertar que esse novo acesso, pela sua dimensão, constitui por si só uma obra sujeita a avaliação de impacte ambiental, e que uma parte muito significativa do traçado com aterros e escavações pronunciadas, atravessa áreas agrícolas de muito elevado valor cénico”.

Relativamente a resíduos a empresa propõe criar uma instalação de rejeitados (TSF) dedicada, mas a CA afirma que tal “reduz a probabilidade de contaminação do solo a partir dos resíduos provenientes da lavaria”, mas deixa cair a exigência feita anteriormente de melhor estudo sobre a caracterização da perigosidade de todos os resíduos de extração (incluindo os ditos “inertes” que continuarão a ser colocados em escombreira). É neste contexto que a CA emite um parecer favorável, se bem que condicionado a medidas mitigadoras e condicionantes diversas”.

Neste contexto, a DORVIR do PCP reafirma que o País deve “conhecer as suas riquezas, nas quais se inclui os seus recursos minerais, e deve avaliar, em cada caso, se a extração é benéfica ou prejudicial, considerando todos os impactos – positivos e negativos – para o desenvolvimento económico, para o interesse público, para o ambiente e para as populações. A avaliação a fazer deve ter como elemento central o interesse nacional e não os interesses económicos privados ou a estratégia da União Europeia, que não se podem sobrepor, em momento algum, à defesa do ambiente e interesse das populações. Tal apenas pode ser garantido se o processo for conduzido e implementado a partir do Estado, o que implica existir uma entidade pública com capacidade, em meios humanos e técnicos, para realizar campanhas de prospeção e pesquisa, sem estar para isso dependente das multinacionais. Aquilo que o processo da Mina do Barroso comprova é que enquanto não existir essa capacidade, processos como este levarão a situações em que o interesse nacional é relegado para segundo plano, permitindo situações de autêntico saque aos recursos nacionais a partir de empresas que, tais como o grupo Savannah, recorrem a esquemas de transferência de lucros – por exemplo através das suas holdings na Holanda -, para evitar a tributação dos lucros nas jurisdições onde são criados. Acresce ainda que as concessões das reservas de metais básicos ao capital estrangeiro e a sua não valorização no país, visa captar investimento estrangeiro de empresas com o objectivo de obter, num relativamente curto espaço de tempo, elevados lucros, após o que se deslocam para outras paragens onde repetem o mesmo comportamento, deixando atrás de si um rasto de desemprego, depressão e consequências ambientais nefastas. A defesa do desenvolvimento económico, do interesse público, do ambiente e dos interesses das populações só pode ser salvaguardado com um processo conduzido exclusivamente na esfera pública, com envolvimento de juntas de freguesia, câmaras municipais e populações. Mais uma vez se comprova que a entrega da concessão da Mina do Barroso à Savannah não garante a salvaguarda dos interesses do País e das comunidades locais, do ponto de vista económico, social e ambiental”, conclui a Direção da Organização Regional de Vila Real do Partido Comunista Português.


27/08/2023 Jornalista: Paulo Silva Reis Repórter de imagem: DR

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